Carta "O Universo"

Ola!

Acho curiosa a relação entre Ain enquanto Nada, e também como Olho. Acredito que ele (Kenneth Grant) use a mesma grafia da palavra em línguas diferentes e relaciona a Gematria de uma palavra com a da outra e faz uma síntese das duas Qabalas diferentes. Não sei até que ponto é legítimo este intercambio dos símbolos de idiomas diferentes. Sei que existe o Universal simbólico comum as várias tradições humanas. Mas não sei até que ponto não há, também, as particularidades.

De qualquer forma, minha mente consegue me dar uma relação entre Ain como o Nada e Ain como Olho, ou Ain soph. E relacionando isso também com o conceito de anti-ser (prefiro dizer não-ser, mas não sei até que ponto estamos falando da mesma coisa).

Vou fazer uma breve descrição do que entendo por Ain, Ain Soph, e Ain Soph Aur.
Este comentário é baseado na segunda parte da introdução do Livro de Thoth "O Tarô e a Santa Qabalah", e também no ensaio Ontológico Berashith, do Crowley.

O Nada, (Ain). O Nada sem limites, (Ain Soph). O Nada como luz sem limite. (Ain Soph Aur).

Este Véu do Negativo é a primeira e fundamental condição de possibilidade da existência de qualquer coisa. Qualquer coisa que exista, o Ser, a Existência, ocorre dentro deste Véu do Negativo (Ain, Ain soph, e Ain Soph Aur).
Primeiramente o Nada como Absolutamente Nada, sem substância, sem Ser, como vácuo, como vazio, deve ser admitido pela lógica racional. Este Nada Absoluto seria Ain.
Este Nada Absoluto é Ilimitado. Então Surge Ain Soph. Não pode ter limite, pois não é alguma coisa, não se está no Espaço, mas antes é a condição do próprio Espaço. O Espaço Infinito é a própria junção e unidade destas três partes do Véu do Negativo. As três partes do Véu do Negativo embora possam ser classificadas separadamente, formam uma grande unidade necessária de um para com o outro dos três conceitos do Véu Negativo.
A própria denominação cabalista de Véu do Negativo, é interessante. A palavra Negativo é interessante se comparado ao Positivo. Mas, negativo aqui como sinônimo de não-ser, de não-matéria-energia, de não-existência. E positivo como sinônimo de Ser, de Existência, matéria-energia. Embora, em todo caso, o Ain Soph Aur, seja uma substância, a substância que é a condição de possibilidade das outras substâncias, da multiplicidade. Esta substância, este Ser, que é a própria constituição do Espaço Infinito, é chamado pelos cabalistas de Ain Soph Aur, que Crowley compara ao Eter, dos cientistas modernos, e nós podemos comparar com a Matéria Escura, da física contemporânea, e, também com os conceitos de Nada de Nietzsche, Heidegger e Sartre.

Ain, é o Nada Absoluto. Este Nada deve ser Ilimitado, Ain Soph. Mas, além de ser ilimitado dever ser constituído por algo, este algo é chamado de Ain Soph Aur, Luz sem limites, uma Luz infinita que é a substância do Espaço Infinito. Então, aqui surge uma definição deveras interessante. O conceito de Luz. Podemos associar a Luz com o Olho. Pois bem, uma Luz Ilimitada presente em todo o Espaço Infinito, sem um objeto de onde ela se origina (uma Estrela), sem objetos para iluminar, sem olhos para vê-la, está Luz seria Escuridão.

Um outro conceito interessante é a relação desta Luz Ilimitada, Com o conceito contemporâneo de Consciência, que seria o próprio negativo do ser (Através do conceito contemporâneo de Consciência pode-se relacionar a palavra Ain, com não-ser e com o Olho). Pois, como diz a fenomenologia de origem husseliana, Consciência é sempre consciência de algo, mas, em todo caso, não é este algo, mas a consciência deste algo. A Consciência sempre se separa do objeto que ela tem consciência, ela sempre não é ele, mas a consciência dele. Ao mesmo tempo que eu tenho consciência do meu corpo, eu sou o meu corpo, mas eu não sou o meu corpo, sou aquilo que tem consciência que há um corpo o qual eu sou e não-sou. Isso pode ser lido em Nietzsche, Heidegger e Sartre. Está Consciência negativa, não-existente, é sem limite (ver a introdução do livro "O Ser e o Nada do Sartre"), pois não é uma partícula, um Ser, é o Nada. Este Nada, esta Consciência ilimitada, mas que se limita em um corpo, pode ser a substância do Espaço Infinito. A Consciência pode ser o Ain Soph Aur. O Véu do Negativo, comparado a Existência positiva.
Kenneth Grant no Livro "O Renascer da Magia", faz uma relação entre a Consciência e Hadit, dizendo que Hadit é a própria consciência. É interessante ver também que no Liber Al, Nuit e Hadit acabam sendo a mesma coisa, um sendo o outro. Seria como dizer que a Substância de Nuit é Hadit.

Um outro conceito que não poderia de deixar de tocar é o Fato que o Véu do Negativo não é o criador do positivo. Dele não surgiu a Existência. Não é o caso de no princípio haver o Nada, como Ain, Ain Soph, e Ain Soph Aur, para deles surgir, ou se manifestar o Ser, o positivo, a Existência. A existência não surgiu do Nada, ela é Eterna. Simplesmente para haver a Existência ela precisa se manifestar neste Espaço Infinito, que a primeira e fundamental condição de possibilidade de qualquer coisa que seja. ("Não existe outro deus além de Me e meu senhor Hadit" Liber AL).

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Acho curioso também, Kenneth Grant, associar a manifestação deste Nada em uma substância feminina, um kala que se manifesta na Mulher, talvez o sangue menstrual, o ovo. Acredito também que a Luz Ilimitada, a própria Substância do Espaço infinito seja tão tênue, que envolva e preencha todo o ser, como um pano jogado em um mar, cuja as águas do mar, por serem mais sutil encharcam e atravessam este pano. Assim acho que a substância do Espaço Infinito seja tão tênue que atravesse todo os demais existentes. Associar isto com um kala, é interessante, mas não sei dizer até que ponto.

Estamos falando de vários conceitos ao mesmo tempo, o que torna a discussão rica de conteúdo mas dispersa.

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Sobre a Carta O Universo, ela pode ser um glifo tanto do Véu do Negativo, quanto do Positivo, significando tanto o Ser, como o Não Ser. Assim ela seria um glifo do Todo, se entendido como o "Total" que envolva o finito e o infinito (mas o infinito não é um Todo, como união tanto daquilo que é como daquilo que não é. Mas o infinito nunca pode ser dito como um Todo, pois ele é infinito. O Todo sempre seria limitado e finito. O Todo da existência é finito. Infinito seria o Espaço Infinito e sua substância, e não poderia ser chamado de Todo, pois não tem fim. Então, a carta deve significar o Todo, enquanto o Todo Existencial. Ou o Todo e o Infinito. Bem, eu posso estar fazendo uma divisão que não divide, que é a do Todo com o Espaço Infinito, ou do Véu do Negativo Ain, Ain soph e Ain soph Aur, como diferente das demais existências. Mas dizer que o não-ser é o ser, e que Ain soph Aur é a própria matéria, seria dizer que a matéria é infinita e ilimitada, o que é uma conclusão inusitada. A ideia do Contínuo Espaço-Tempo entendida de uma maneira nova. A ideia de Matéria infinita. De existência infinita. De um contínuo de Matéria, sem separação, que preenche todo o Espaço Infinito.

Se lembrar de mais alguma coisa que ache importante para nossos pensamentos eu posto aqui.

Atenciosamente.

Opa!

Corrigindo um erro.

Ain significa Nada e tem por número 61, Ayin (uma letra do alfabeto hebraico) significa Olho e seu número é 70, da Qabalah Hebraica. Não sei se Grant soma ambos como 61. Se fizer isso pode estar errando.

Att.

Só mais uma observação.
Alguém citou a relação da Carta em questão com o simbolismo do Peixe, que parece que o Sr. Grant faz esta associação.
Estava foleando o Livro de Thoth, devido ao fato de hoje ser uma Sexta-feita 13, fui ver algum simbolismo na carta 13, que é a Carta da Morte, os de Thelema devem estar familiarizados com o novo conceito de Morte trazido pelo Liber Al, que é como a Vida, Morte é Vida. Uma dissolução e coagulação interessante em Thelema, da Morte com a Vida.
Na descrição da Carta XIII "Morte", crowley toma o Peixe como um simbolismo muito importante para a Morte. Ele relaciona, de uma forma plausível (pois, ao final das contas, todos os símbolos são intercambiáveis e misturáveis e complementares), o peixe com a serpente.
Interessante notar que na nota de rodapé da pg 97, do "Livro de Thoth", publicado pela Madras em 2000, o autor faz uma analogia interessante ele iguala dizendo "Peixe=NVN=Escorpião=Serpente". Além de muitas outras coisas interessantíssimas, que cabem a esta discussão que ele faz na descrição da carta "Morte".

Atenciosamente.