Ok, vamos falar sobre Caos

Senhores, amigos, irmãos…

93!

De uns tempos pra cá tenho procurado ser econômico no que tange à criação de novos tópicos dado o grande número de tópicos que se repetem em assunto e natureza, entretanto, dessa vez me vejo forçado a criar uma postagem. Não é meu hábito e nem gosto de ver postagens que não sejam inquisitivas, mas preciso esclarecer algo que tem me incomodado.

Há anos tenho sido um entusiasta daquilo que modernamente se habitou chamar de “Caos Magick”, e dito isto, quero enfatizar uma coisa que já andei dizendo em outro tópico, o fato de, ou as pessoas estarem muito equivocadas sobre o que venha a ser esse paradigma mágico; ou eu o estar.

Ocorre que me parece que popularização dessa inclinação mágica tem lhe aleijado daquilo que, além de ser a sua melhor característica, também lhe serve de fio condutor, no caso, a propriedade que permite, a cada um que assim deseje, a construção de um sistema íntimo e individual para além da tirania da crença cega e do dogmatismo alienígena. No entanto, uma vez privado dessa prerrogativa, tem descambado para se tornar um conjunto de práticas simplistas e pré-formatadas voltadas parta satisfação de desejos mundanos e dissolução de contratempos cotidianos. O paradigma mágico que trabalha com as premissas de Kaos e Kia está para o que se transformou atualmente o Caoísmo (servidores, sigilos e cultura pop) como o arquétipo está para o deus; que quando “um” vira o “outro”, obrigatoriamente deixa de ser o “um”.

Trabalhar com magia do caos, por didático que se goste de fazer parecer, não é brincadeira pra crianças, e nem tampouco algo fácil ou de menor importância. Mesmo a magia de sigilação, que nasceu com Austin Osman Spare, e hoje parece ser a cara midiática do sistema, não é uma coisa simples. As pessoas falam de entrar em estado de gnose como se fosse algo corriqueiro e usual como abrir uma porta ou fechar uma gaveta, e não é. Além do que, a teoria mágica do Caos não passa necessária e obrigatoriamente pela magia de sigilação, muito embora essa última esteja embasada teoricamente pela primeira.

Esse é um sistema que, por mais que se inflacione em práticas (muitas das quais bizarríssimas, é bem verdade) carece de conteúdo moral, já que essa é uma de suas propostas, a de não ter dogmas. Entretanto, isso é assim, quero crer, não porque estas sejam propostas indesejáveis dentro do viés mágico de cada um, mas sim para dar a liberdade aos praticantes de incorporarem ao seus sistema mágico o seu próprio conjunto de regras - posto que todos temos um -, sua própria Lei, ao invés de ter de viver pela Lei do outro.

Apesar dessa prática ter pretensamente nascido nos anos 70 com Peter J. Carroll inspirado no casamento do Zos Kia Cultus de Spare com qualquer coisa do Crowley, qualquer um que conceba uma estrutura ritualística e a adeque a um sistema qualquer de crenças, estará se usando dessa premissa, a de que não são as coisas em si, mas a energia emocional que depositamos nelas que colocam o mágico em movimento em nós e a partir de nós. É entender a natureza da ilusão e jogar com Yesod no bolso.

Além de tudo, os conceitos de Kaos e Kia de Spare são profundos, interessantíssimos e indispensáveis para o entendimento da ideia por detrás do sistema. Negligenciar a base da teoria é aceitar que magia do Caos se reduz a servidores para encontrar gatos. E eu insisto que a Magia, para aquele que Busca, é uma ferramenta que tem apenas uma única finalidade.

Se alguém tiver algo a acrescentar, está aberta a discussão. O intuito é fazer o caminho inverso do que tem ocorrido, despopularizar, tirar do banal e tentar fazer a galerinha que está procurando por soluções mágicas entender que magia não é solução mágica pra nada, e que Caos não é bagunça.

Grato pela atenção dos senhores e perdão pela introdução longa.

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Aluvaia!

Faze o que tu queres há de ser tudo da Lei!

É edificante ver Magick ser levada a séria como deveria. Sinto que a popularização do ocultismo através de ordens como a O.N.A. e similares, principalmente os grupos ligados ao Caminho da Mão Esquerda, que de várias formas “deturpam” o que realmente foi passado adiante por ocultistas sérios, atribuindo-lhes uma estética grunge ou mesmo sinistra.

Contudo, é necessário que eu seja franco, pois já brinquei de sigilar desejos fúteis sem o conhecimento necessário para alcançar o que é “pedido”. Muitos tropeços aconteceram em decorrência destes descuidos, mas muito foi esclarecido.

Após estudar parte do trabalho de Spare foi possível compreender onde a maioria se perde ao buscar a negação do dogma, para que se possa empregar qualquer um. Ainda sim resta o questionamento. Na sua visão, o que é Zos e em que ponto este se torna Kia?

Amor é a Lei, Amor sob Vontade!

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Salve!

Todo mundo, ou quase todo, chega à Caos Magick atualmente pela via da magia de sigilação, eu não sou exceção, e confesso que nunca tive problemas com esse tipo de prática. Ocorre que na vida se anda pra frente, e quem se contenta com o superficial nunca chegará à profundeza. Eis o grande problema, as pessoas não entendem que isso é uma forma de magia, que apesar de não ser reles ou ordinária, vem sendo usada de maneira indiscriminada para finalidades banais, o que acaba estigmatizando toda uma técnica baseada em teoria séria e com argumentações relevantes.

Ainda sim resta o questionamento. Na sua visão, o que é Zos e em que ponto este se torna Kia?

Não são conceitos de muito fácil compreensão. Ler Spare é difícil e não dá pra dizer que ele tenha a boa didática de Crowley, e muito embora eu já tenha falhado miseravelmente em tentar entendê-lo, ainda assim vou me arriscar a dar uma interpretação particular sobre esses termos basilares do sistema.

O Culto de Zos Kia era o sistema desenvolvido e praticado por Spare. Zos, além de ser o nome mágico do próprio, seria, grosseiramente falando, uma conceito semelhante ao ego, ou melhor dizendo, à mente consciente ou, ainda melhor, à manifestação da consciência. Zos pode ser entendido como um produto do Kia, ou um desdobramento (ou continuação) deste no Universo material manifesto.

Kia é um fragmento do Kaos, podendo ser considerado uma porção da nossa mente inconsciente (seu precursor, na verdade) que está algo entre o individual e o coletivo, um conceito aparentado com o que se poderia considerar abrangendo, em sua escala macro, tanto a Mente Universal, quanto em sua escala micro, a Essência do Homem. É seu Verdadeiro Eu, o perfeito avatar de seu S.A.G., a fagulha dentro dele que o mantem em contato com o Kaos, sendo este último A Grande Fonte de manifestação de todas as coisas, uma espécie de “Nada” latente de se tornar o que quer que seja, aquilo que está para Ser (intransitivamente falando), imanifesto, mas causa e razão íntima de tudo o que existe, o vazio sobre o qual o Pilar da Existência está assentado.

Quando tratamos desses conceitos abstratos é importante que tenhamos em mente que não estamos falando de “fronteiras”, do tipo, aqui começa isto, ali termina aquilo, mas sim estamos diante de algo que começa em Zos e termina em Kaos, e vice-versa, com uma flor que se abre do centro para fora, uma existência num contínuo degrade, do 0 para o 1 e de volta para ao 0.

Não sei se me fiz compreender adequadamente. Também não acredito que esta seja a posição oficial do Ministério do Caos, tratando-se sobretudo da minha opinião e percepção sobre o assunto. Mas acho que dá pra entender que existe uma certa coerência na teoria e alguma complexidade no pensamento que vão além de preocupações triviais do tipo “putz, não estudei para a prova… e agora? Ah, já sei, vou fazer um sigilo”…

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Não gosto de post consecutivos, mas fico ruminando coisas e parece que sempre faltou algo a se dizer a respeito, assim sendo, peço a paciência dos amigos e prossigo no meu monólogo.

Por algum motivo desconhecido, ou simplesmente porque assim é, sem motivo algum, o Nada parece ser, por assim dizer, abominável; e Kaos é o Nada e, enquanto tal, é totalmente receptivo e eminentemente prestes a ser alguma coisa mediante o mais tênue dos estímulos, e de fato está perpetuamente à espera de que algo o estimule, de algo que propicie um movimento do “Não-Ser” em direção ao “Ser”. E este estímulo é o Desejo.

Kia já é “algo”, sendo a manifestação primeira do Kaos, ou melhor dizendo, a continuação deste, e ele, como já disse, se transforma em Zos quando toca o universo material, manifestando-se em forma de Consciência Universal. Entretanto, entre a mente consciente e Kia está a mente inconsciente. Kia não é individual, a princípio, tonando-se aparentemente individualizado conforme se aproxima da mente consciente, mas isso é uma ilusão, pois até a mente inconsciente da gente se coletiviza conforme se aprofunda em direção ao Kia.

A mente inconsciente é a porta de entrada para o Kia e, por correspondência, para o Kaos, e é a partir da linguagem simbólica dessa estrutura psíquica que conseguimos introjetar o desejo e assim produzir o estímulo capaz de fazer essa fonte toda receptiva vir à existência manifesta. Eis a base da Magia de Sigilação.

Mas o caminho inverso também pode ocorrer, isto é, de recebermos “sinais” do inconsciente mediante impulsos do Kia. Eis a teoria que explica coisas tipo precognição, intuição, insights e até algumas formas de divinação.

Não tenho certeza se o conceito de Kaos é ideia de Spare, acho que ele se deteve em Zos e Kia, tendo vindo à baila o termo só nos anos 70 por contribuição de Carroll, mas acredito que complemente formidavelmente a teoria.

Pronto, prometo que agora me calo. : )

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Por mais que exista uma teoria mágica (e até cosmogônica) por detrás da magia de Spare, teoria esta que o fez desenvolver seu próprio sistema, este é representativo apenas e tão somente da magia individual de Spare. E a partir das ideias de Spare temos dois ou três visionários que contribuíram com elementos interessantes, e depois deles toda uma leva de imitadores, repetidores e arremedadores - a própria cópia do rascunho do inferno.

O erro começa quando se propõe que magia do caos seja um sistema; ela é uma teoria mágica e não um sistema. Ela deveria ser entendida como uma base teórica abrangente e que servisse de alicerce para o desenvolvimento de quaisquer sistemas, estes com suas próprias metodologias e seu conjunto de crenças.

Acho que o problema pode estar no nome (sério, nomear é limitar e até estigmatizar, às vezes), que torna tudo meio sensacionalista e tende a predispor necessariamente ao excêntrico. Criou-se uma espécie de “Magia Quimérica”, e penso que este seja meio que um caminho sem volta. Acaba que a degeneração parece se mostrar uma regra comum não apenas ao que é grosseiramente material, mas também aos sistemas de pensamento e mesmo aos conjuntos de ideias, como se fossem afetados estes por uma força similar a entropia. Tudo vira sempre mais do mesmo.

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Vejo que o monólogo se estendeu à beça!

Sua ideia de Zos e Kia é bastante esclarecedora, e na sua crítica a maneira como é vista/praticada a Magia do Caos ficou explícito um pensamento que, com certeza, passou pela cabeça de muitos estudantes dos cerimonialismos através da história: A teoria se tornou uma grande quimera, não necessariamente boa ou ruim, mas que é dificilmente interpretada com clareza, o que leva muitos à numerosos problemas práticos.

Algo que gostaria de pontuar também é que, visualizando esses conceitos, sinto-me preso entre Kether e Chockmah de um mundo em ruínas, uma loucura sem fim em busca de algo que não se pode definir: Kaos.

Agradeço por ter compartilhado!

93 93/93.

Vejo que o monólogo se estendeu à beça!

Na verdade, entre o meu penúltimo e meu último posts nesse tópico havia uma pergunta, ou uma colocação de alguém (que não me lembro quem) e que por algum motivo foi deletada, fato que deixou meu monólogo parecendo ainda mais comprido e estranho. Mas tudo bem, causar alguma estranheza já é um começo.

Algo que gostaria de pontuar também é que, visualizando esses conceitos, sinto-me preso entre Kether e Chockmah de um mundo em ruínas, uma loucura sem fim em busca de algo que não se pode definir: Kaos.

É, realmente uma sensação interessante. Essas abstrações nos remetem mesmo ao indefinível, quase ao inconcebível, como é o caso, por exemplo, da ideia do “Nada” - algo que a mente humana, não apenas não alcança, como muitas vezes abomina.

Agradeço por ter compartilhado!

Grato eu pela oportunidade, por seu interesse e sua paciência!

93,93/93.

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