"Os escravos servirão."
Vários conceitos podem ser tirados desta frase: o conceito de escravidão; a relação de escravidão com liberdade; o conceito de liberdade; a relação entre escravidão e servidão; e o conceito de servir.
"Os escravos servirão."
Vários conceitos podem ser tirados desta frase: o conceito de escravidão; a relação de escravidão com liberdade; o conceito de liberdade; a relação entre escravidão e servidão; e o conceito de servir.
Liberdade está relacionada à ação. Liberdade é ação desimpedida. Toda ação é ação dentro de um universo que forma um enredo de elementos distintos, e, ao mesmo tempo, mutuamente dependentes. Logo, liberdade é ação desimpedida dentro de um enredo universal. Liberdade é uma ação que não é impedida por algum outro elemento dentro do ambiente da ação. A única ação desimpedida é a ação que está em harmonia com os outros seres que a que a circunda, de modo que nenhum elemento a empeça em seu ato. Logo, uma ação que é impedida não está em harmonia com os demais elementos pertencentes ao enredo da ação. O impedimento da ação, o que leva a não liberdade, são os contrários se chocando um impedindo o outro, por não estarem em harmonia. Mas também existe a não-liberdade.
O conceito de escravidão é complexo. A princípio, poderia ser definido como a posse de alguém sobre outro alguém, de modo que o submetido estaria em poder do seu “dono”, ou “senhor”. Uma escravidão forçada. Mas podemos definir escravidão de outras maneiras, como, quando a pessoa rende sua liberdade, deliberadamente, para algo. Uma pessoa que se entrega e se anúla em função de uma ideia, uma religião, ou uma Verdade que ela venha a acreditar. Seria a escravidão consentida. A liberdade entregue por livre escolha. Poderíamos dizer, também, sobre outra forma de escravidão, a escravidão por um ato, por um vício, por uma mania, um comportamento. Quando este vício ou hábito e comportamento, obrigam a pessoa a agir, as vezes, sem sua vontade. Forçando-a inconscientemente e conscientemente a agir de tal maneira. Como uma tendência interna que a levaria a agir de tal modo. Uma compulsão genética, ou um hábito adquirido, um vício alimentado. Além destes conceitos, poderíamos dizer, agora mais profundamente, que qualquer ato dependente, qualquer ato que não seja por si, mas devido a alguma coisa, constrangido por algo, motivado por uma situação, provindo de uma fonte já existente interna ou externamente é uma ação não completamente livre. A ação livre seria aquela que se move do nada. Que surja inesperada e completamente autêntica. Mas, por outro lado, toda ação é ação dentro de algo já pré-definido. Todo ato de uma pessoa não é um ato completamente livre, ou seja, todo ato de uma pessoa é dentro de um quadro determinado da capacidade e possibilidade de suas ações que são limitadas ao seu meio. Então, agora, nós somos escravos do ser. Não se é completamente livre. A liberdade da ação vai até o limite de suas possibilidades de ação, tanto biológicas e psíquicas, quanto sociais. Liberdade seria o Nada. Mas, acontece que o homem possui a semente do nada. A verdadeira essência mesma do Homem é um Nada, um Não-Ser, um Negativo. Estar vivo é participar da trama do Ser, mas ao mesmo tempo, não o sê-lo, e, ainda mais, também sê-lo, pois se está no corpo. Se está no mundo, neste momento, nesta situação cósmica. Então se é alguma coisa, um corpo e uma consciência de corpo. Pois está consciência do corpo não é o corpo, embora seja o corpo que tome consciência de si. Esta consciência do ser, é sempre o não-ser, o Nada.
Então, de uma certa forma, todos nós somos escravos por simplesmente existirmos. Somos escravos da existência. Uma forma de liberdade dentro deste conceito seria servir a si mesmo, não a outro. O que não seria uma forma de egoísmo, pois a própria pessoa, para se realizar enquanto tal, necessita de várias outras pessoas ao seu lado e outros seres também. Logo, sempre se está servindo a algo. Sempre se está submetido a alguma coisa, um pensamento, um sentimento, um instinto, uma vontade. O Nada seria a liberdade. Mas o Nada não é o ser. Para o Nada ser identificado e possuir um entendimento do corpo de sua existência ele precisa estar no corpo. A consciência não é o corpo, ela está no corpo. Então, de uma certa forma, nós somos servos do Sol e da Lua e da Terra, do intestino, do coração e do pulmão e tudo mais. Tudo isso é o limite do ser que somos. Nosso real ser, nosso ser de pura liberdade é o Nada, a consciência, o negativo da existência que sempre foge do ser o observando de longe.
Dentro do conceito thelêmico, a frase "Os escravos serviram" pode se remeter aos deuses escravos, aos deuses que exigem adoração e sacrifício, e uma submissão a sua autoridade. Então, um escravo seria aquele que servisse a um deus que o escraviza. Acontece que um Thelemita obedece e serve seu Anjo, ou deus, admitindo, porém, que este deus é ele mesmo. Mas, em todo caso, existe aqui uma diferença em servir e ser escravo, posto que, de uma forma ou outra, um thelemita, ou outra pessoa, serve a algo.
Servir é estar em consentimento a uma ideia, uma causa: servir a humanidade, por exemplo, ou seu Anjo; servir a si mesmo, sendo que este si mesmo envolve a totalidade da existência de tudo o que foi e de tudo o que será dentro deste grande ecossistema chamado Universo.
Servir é diferente de ser escravo. Servir pressupõe a liberdade consentida.
Att.
Obrigado Ethar.
Só um detalhe,
você diz:
"Essa colocação é inadequada e não representa de uma forma clara e honesta a questão da Liberdade referente à Lei. Isso dá a entender que algo externo nos obrigou a existir, o que é inaceitável, pois nos tornaria vítimas, e o Telemita não é uma vítima. Mais, existência não é escravidão ao se admitir que houve algum nível de escolha. Escolha não de algo externo que nos torna vítimas, mas de nós mesmos, ou se preferir, de Deus, ou do Sagrado Anjo Guardião.
É mais aceitável referir-se à existência como servidão. Mas o que importa é entender como escolha."
Isso é uma discussão interessante, a Liberdade de Escolha, ou Livre-Arbítrio.
Pode ser que não escolhemos ao ponto da liberdade como incondicional.
Ex. Se eu ofereço para alguém uma maça e um chocolate para escolha dela. É fato que a escolha dela não será livre, ou seja, será condicionada ao seu desejo do momento. Se ela resolve escolher aquilo que ela não quer naquele momento, o desejo de contrariar seu desejo original é o que fará a escolha nela, ou seja, o desejo de contrariar seu desejo será maior que o desejo por maça ou chocolate.
Ex. Se eu estou vendo um filme no cinema e sinto vontade de ir ao banheiro. É fato que eu não escolho sentir vontade de ir ao banheiro, esta vontade simplesmente se manifesta em mim sem minha escolha (nós não temos liberdade em relação a nossa biologia, de sentir fome, sede, sono, vontade sexual, tudo isso se manifesta na gente sem nossas escolhas. Ninguém escolhe sentir fome ou não. Pode se escolher não comer, mas até esta escolha é condicionada por outra vontade mais forte que a comer, que fez a pessoa não comer naquele momento, outra vontade nela, vontade de estudar, ou fazer pranayama etc.). Deixe-me continuar o exemplo. A pessoa esta vendo um filme no cinema e vem nela a vontade de ir ao banheiro. Então ela diz para ela mesma "não vou agora, vou depois". Esta decisão é erroneamente interpretada como a liberdade da pessoa sobre aquela vontade que ela não escolheu. Mas, acontece que até mesmo esta decisão "não vou agora" ela não escolhe, é uma outra vontade maior do que aquela de ir ao banheiro, ou seja, a vontade de continuar vendo o filme, que ela também não escolheu. Isso são ilusões de escolhas. Na verdade a vontade mais forte naquele momento vai ditar a regra da ação, e acontece que nós não controlamos as vontades em nós. Até mesmo a vontade de suprimir as vontades é uma vontade que se dá em nós por vários motivos. Os motivos mesmo são recursos mentais para atos que se manifestam em nós. Elas surgem por si. Toda vontade, inclusive a V.V, surge na pessoa automaticamente, vamos dizer, inconscientemente.
Não seria alguém nos obrigando exteriormente ou interiormente. Acontece que a própria ação individual é Universal. A ação é maior do que aquele que age.
Isso é como dizer que não há como escapar do cumprimento da V.V. Não há escolha.
Sendo assim, quis dizer que servimos o ser, o ser é a regra e nós estamos dentro do ser (existência), nós o somos, não há como escapar, por enquanto. Então, interna e externamente (para mim é a mesma coisa meu interior e meu exterior), as coisas acontecem e as vontades surgem uma por cima das outras, uma mais forte que as outras. A vontade dominante e mais forte pode ser definido como a V.V.
A liberdade seria estar de acordo com o destino, seria querer o necessário, querer a vida e aquilo que fazemos aqui.
Se escolhemos nascer ou não, isso escapa a minhas conjecturas. Se escolhemos nascer, tem gente que faz escolhas estranhas então (escolher nascer pobre, cego, e em uma família que o maltrata rsrs). Se escolhemos nascer, escolhemos nascer em um ambiente em que todos os fatos depois disso nós não escolhemos.
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Só mais um comentário sobre os sacrifícios. Acredito que existe um estado em uma pessoa, que chamo (e acho que o Profeta chamava também) de “Beatitude Suprema”, onde a pessoa ama. Ama sua vida. Ama existir. Ama o Universo. E este estado de amor incondicional, onde o Universo se revela como um “cristal perfeito”, existe uma certa adoração da vida. Mas sacrificar algo por algo, a não ser se for meu tempo para o cumprimento da V.V, mas isso não seria um sacrifício, seria pura alegria.
Att.
Al, I:21. Com o Deus & o Adorador eu nada sou: eles não me veem. Eles são como sobre a terra; Eu
sou Céu, e não há outro Deus além de mim, e meu senhor Hadit.
Acho este versículo Lindo. "Com o Deus & e Adorador eu nada sou". Gosto da parte "nada sou".Talvez o adorador adore o Nada, "eles não me veem", não há um imagem de Nuit, pois ela é contínua.
Bençãos e Venerações ao profeta da Amorável Estrela.
O Amor é a Lei, Amor sob Vontade.
Sim, me referia a Visão Beatífica, obrigado. Na minha opinião, não existe maior poder do que se inflamar em oração.
A oração movimente o interior, movimenta os planos, deixa a vida mais mística e mágica. Abre o olho para o divino.
Só queria fazer uma retratação a mim mesmo, para o meu coração.
Sobre o Adeptado nada sei.
Não me digo Thelemita.
Nutro uma enorme respeito por Crowley.
Sou um humilde buscador da Verdade.
O que escrevo aqui é um compartilhar experiências, somente isso.
Sou um humilde servo de Deus.
Muitas vezes cego e raramente eu vejo.